Curiosidades

Os receios de trocar de carreira – parte 4

7 Minutos de leitura

Conhecer a si mesmo é o primeiro passo para qualquer tomada de decisão. Muitas vezes as pessoas buscam interpretar o próximo, examinar situações ou perspectivas sem perceber que o mais importante é o autoconhecimento. Afinal, a perspectiva sob a qual avaliamos cada situação ou cada pessoa impacta consideravelmente qualquer movimento, transição, relacionamento… 

Trago essa pauta, pois para finalizar a nossa saga sobre os principais receios ao optar por trocar de carreira, e talvez o mais complexo deles, é bastante peculiar. Digo isso por se tratar de um medo que não é tangível ou não existe uma explicação lógica. Costumo denominá-lo como o ‘’medo do novo’’.

Sim, é verdade que todas as mudanças geram desconforto. Porém, nada é mais constante do que as mudanças. Logo, esse receio tende a aparecer não apenas quando pensamos em uma nova carreira, mas que surge até mesmo em transições internas dentro da própria empresa ou qualquer outro movimento desse gênero.

Como se trata de um sentimento bastante específico, em que a raiz está mais ligada ao próprio autoconhecimento e a manifestação do mesmo, ele pode variar bastante de pessoa para pessoa.

Por essa questão, quero convidar uma especialista no assunto. A Anna Raffaella Kramer é psicóloga de formação e pela sua experiência, com certeza é uma das pessoas mais indicadas para explicar como identificar, amenizar ou superar esses receios. Tenho a oportunidade de trabalhar em conjunto com ela, que hoje é Head de Expansão na Messem, sei que já presenciou as mais distintas manifestações dessas preocupações e vai compartilhar sua experiência conosco:

O que é o ‘’medo do novo’’?

Do ponto de vista da Psicologia, o medo é um estado afetivo e emocional, necessário para a adaptação do organismo ao meio. Com relação ao aspecto social e cultural, o medo faz parte da construção do caráter de uma pessoa ou de uma organização social.

Partindo do pressuposto cultural, somos ensinados e modulados através do que a sociedade nos ensina e diz ser certo ou errado, normal ou anormal, seguro ou inseguro. Nossa aprendizagem vem através do social, das experiências que vivenciamos durante nossa vida e do mundo em que estamos inseridos. 

Qualquer coisa que pareça nova ou diferente do que estamos adaptados, nos causa receio e diante disso entendemos como ameaça ou perigo, e consequentemente isso gera uma variedade de sentimentos, como medo, angústia, ansiedade. Esses são estados afetivos normais para nossa adaptação frente a algo novo. 

É impossível aqui não falarmos também sobre ansiedade que é uma resposta emocional provocada por medo, e que geralmente aparece quando estamos diante de algo novo e diferente. Tentamos prever o futuro, e muitas vezes já visualizamos o pior desfecho no final. Quem nunca se questionou ao tomar uma decisão, no sentido de: “E se não der certo? E se eu não conseguir?” Por isso, é importante entendermos que o medo é inerente ao processo de mudança, é importante entendermos isso para que não deixemos de tomar uma decisão por medo.​

Esse é um sentimento comum?

Sim, o medo é um sentimento comum a todo ser humano, e que nos protege de possíveis perigos do cotidiano. O medo é um sentimento da sobrevivência humana.

Então, se você sente medo frente à uma mudança, acolha esse sentimento, pois ele é normal, e faz com que estejamos preparados para enfrentar as situações da melhor forma e finalmente nos adaptar. 

O ponto que precisamos ficar atentos é se o medo é adaptativo ou desadaptativo. O segundo dá ordens irracionais, muitas vezes distorcidas da realidade e nos paralisa, fazendo com que não nos movimentemos, porque de fato é mais confortável ficar onde já estamos adaptados. 

Portanto, é importante conectar-se ao que de fato você quer, seu propósito e valores, avaliando se o que faz você paralisar é realmente perigoso com dados reais, ou se é apenas o medo normal da mudança. Converse com amigos, converse consigo mesmo, e racionalize esse sentimento, buscando evidências do que é realidade e o que é irracional. 

Existe alguma explicação psicológica ou cientifica para esse sentimento?

Sim. Existem algumas explicações para esse sentimento, sendo teorias com base comportamentais, cognitivas, neurofisiológicas, entre outras. Segundo Aaron Beck, o medo é um estado neurofisiológico automático primitivo de alarme envolvendo a avaliação cognitiva de ameaça ou perigo iminente à segurança e integridade de um indivíduo. 

Um achado importante por pesquisas na neurociência é o papel central da amígdala no processamento emocional da memória, na avaliação de estímulos com significado afetivo e na avaliação de sinais sociais relacionados a perigo.

As pesquisas de LeDoux (1989, 1996, 2000) contribuem para apresentar a amígdala como uma estrutura importante no processo de medo condicionado. LeDoux conclui que a amigdala é o eixo na roda do medo, ela está envolvida na avaliação do significado emocional.

Quando estamos na presença de perigo, ocorrem reações endócrinas, autonômicas e comportamentais em nosso organismo. A ativação da amígdala produz a estimulação de redes responsáveis pelo controle da expressão de uma variedade de reações.

A amígdala compõe-se de vários núcleos e nem todos estão implicados no condicionamento do medo, mas os núcleos central e lateral têm participação fundamental neste processo. O núcleo central constitui a principal conexão com as áreas que controlam as reações emocionais.

O cérebro é programado para detectar perigos, tanto aqueles com que nossos ancestrais se deparavam quanto aqueles aprendidos no nosso dia a dia por cada um de nós, a amígdala e suas conexões de entrada e saída são centrais nestes processos. 

Pode variar de pessoa para pessoa?

Medo é pessoal, ou seja, o que assusta um pode ser indiferente para o outro. Isso vai depender de pessoa para pessoa, desde a forma como sente até como esse enfrentamento acontece. 

Algumas pessoas podem ter mais dificuldades em enfrentar os próprios medos, enquanto outras se esquivam do sentimento com facilidade. Isso vai depender da história de vida dessa pessoa, tanto por experiências de vida, quanto por histórias familiares ou do seu meio que acompanhou. Aqui, novamente é importante avaliar o que é dado de realidade e o que são pensamentos condicionados que temos frente à determinadas situações, por isso é tão importante o autoconhecimento.​

Quais foram as principais preocupações além do receio pelo novo ao longo da sua experiência?

Durante esses anos de experiência, falei com muitas pessoas, em diferentes segmentos e com as experiências mais diversificadas no mercado de trabalho. Desde profissionais iniciando a carreira, até altos executivos com mais de 20 anos de profissão, sendo em bancos até multinacionais. Para todos, sem distinção, posso falar que sempre existe algum receio, e costumo dizer que fico muito tranquila quando as pessoas possuem algum medo – estranho é quando não se tem – porque ele é natural e inerente quando estamos diante de qualquer mudança. 

Os medos mais recorrentes costumam ser com a incerteza, o “medo de não dar certo”, “trocar o certo pelo duvidoso”, e o ganho financeiro. Na maioria das vezes, o medo não é racional, é um medo infundado em pré-conceitos que distorcem a real percepção. 

É quando voltamos ao ponto de partida: a sociedade em que vivemos nos ensinou que tudo que foge do modelo convencional da CLT, da carreira fechada, onde a empresa decide o que você vai fazer, nos causa receio e insegurança. 

 No entanto, verdade é que hoje as carreiras estão inteligentes, estamos vivenciando uma quebra de paradigma nesse sentido, as empresas estão também entendendo que esse modelo engessado já não cabe mais no profissional de hoje. 

Falando especificamente no mercado financeiro e no movimento que vem acontecendo, fica muito claro que é algo sólido e seguro. Um mercado que dobra de tamanho a cada ano, tornando-se extremamente ascendente, onde a chance de não ter ganhos financeiros ou de “não dar certo” é muito pouco provável para quem se prepara, conversa e tem perfil para a atividade. Além do mais, o duvidoso se analisarmos racionalmente, pode ser considerado o contrário disso.

Como superar o ‘’medo do novo’’?

Se expor, sem dúvida. Só superamos nossos medos quando reagimos à ele, partindo para ação, realizando um movimento.

Na psicologia, falamos sobre dessensibilização sistemática, técnica usada para eliminar comportamentos que causam medo. Essa técnica ensina que quanto mais nos colocamos frente a uma situação desafiadora, mais aquela situação vai ficando fácil, e é importante que isso aconteça de maneira gradual. 

Ao contrário disso, quando paralisamos e não enfrentamos, acabamos por alimentar ainda mais esse medo, e em alguns casos ele pode ficar em uma proporção maior do que de fato é. 

Que mensagem você deixaria para as pessoas que pensam em mudar de carreira?

Se conecte com seus valores e propósitos. Quando nos conhecemos a ponto de saber o que gostamos de fazer, tudo fica mais fácil. Se você não sabe, procure conversar com profissionais que possam auxiliar nesse processo, converse com o mercado, comece pelas coisas que não quer de jeito nenhum fazer. Vá aos poucos construindo quem é você no mundo, no mercado e se posicione.

Carreira nos toma um tempo muito precioso, passamos mais tempo no trabalho que em casa, por isso, precisa ser algo prazeroso. Precisamos estar felizes! 

Quando fazemos o que gostamos, fazemos bem e o financeiro acaba sendo inevitável. 

Saiba que se você esperar para mudar com a expectativa de que não haja medo algum, você nunca vai mudar. O medo vai estar ali, ainda que pequeno, e tudo bem! É normal e saudável, ele nos ajuda a nos prepararmos para nossa melhor versão. Não existe crescimento e autodesenvolvimento sem mudança, sem receio e muito menos sem medo, portanto, AJA.  

As transformações no mercado de trabalho, principalmente no mercado financeiro não vão acontecer no futuro; já estão no presente. 

Hoje falamos de protagonismo, porque a carreira é do profissional, é ele quem escolhe o que quer fazer e o que o faz feliz. 

Não espere alguém decidir isso para você, decida você mesmo. Seja protagonista da sua carreira, procure um lugar que acolha você, e que esteja alinhado ao que você busca enquanto valores e propósitos e seja feliz dentro da sua atuação.

Willian Kahler

Willian Kahler é sócio e assessor financeiro responsável pela área de expansão da Messem Investimentos. No mercado há mais de 10 anos, Willian começou sua trajetória como assessor de investimentos certificado pela Ancord. Atraído pelo propósito de popularizar o conhecimento sobre o mercado financeiro e auxiliar pessoas a realizarem seus objetivos por meio de investimentos fora dos bancos tradicionais, tornou-se destaque em sua função. Há cinco anos está à frente do trabalho de contratação e treinamento de novos assessores e foi responsável pelo desenvolvimento e transição de carreira de mais de 350 profissionais. Como sócio também é responsável pelas estratégias de M&A e novas unidades da Messem, uma das maiores empresas de assessoria financeira do Brasil, com mais de R$ 17 bilhões em custódia.

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Sobre o autor
Willian Kahler é sócio e assessor financeiro responsável pela área de expansão da Messem Investimentos. No mercado há mais de 10 anos, Willian começou sua trajetória como assessor de investimentos certificado pela Ancord. Atraído pelo propósito de popularizar o conhecimento sobre o mercado financeiro e auxiliar pessoas a realizarem seus objetivos por meio de investimentos fora dos bancos tradicionais, tornou-se destaque em sua função. Há cinco anos está à frente do trabalho de contratação e treinamento de novos assessores e foi responsável pelo desenvolvimento e transição de carreira de mais de 350 profissionais. Como sócio também é responsável pelas estratégias de M&A e novas unidades da Messem, uma das maiores empresas de assessoria financeira do Brasil, com mais de R$ 17 bilhões em custódia.
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