Artigos

Evergrande: entenda o risco de colapso da gigante chinesa que assusta o mercado financeiro e os possíveis efeitos no Brasil

7 Minutos de leitura

O noticiário econômico do mundo inteiro se voltou para a terceira maior incorporadora do setor imobiliário da China: a Evergrande. Trata-se de uma gigantesca companhia do país asiático que pode ser representar a ponta de um iceberg da bolha imobiliária da segunda maior economia do mundo. 

De acordo com dados divulgados pelo governo da China, a Evergrande possui dívidas acumuladas que somam US$ 300 bilhões, as quais ela não conseguirá honrar. 

Com o anúncio, as bolsas globais despencaram no início da terceira semana de setembro, e não faltaram comparações com a crise dos subprime dos Estados Unidos, marcada pela quebra do Lehman Brothers. 

Para piorar a situação, ninguém sabe ao certo o que pode acontecer daqui para frente. A falta de transparência do gigantesco dragão asiático não ajuda a calmar o ânimo de investidores, que têm medo de um possível efeito cascata no setor imobiliário do país. 

Mesmo assim, para muitos especialistas, uma possível quebra da Evergrande provavelmente será um caso isolado de uma bolha imobiliária relativamente previsível. 

Mas como exatamente chegamos aqui? O que uma possível quebra da Evergrande pode representar para o Brasil? 

Shenzen. Foto: Reuters

A bolha não inflou da noite para o dia 

“Os problemas não acontecem do dia para a noite. Todos agora estão falando da Evergrande, mas isso já era uma crise anunciada”. diz Marcelo Hannud, especialista do mercado imobiliário com mais de 37 anos de experiência no setor. “Ela não passou a dever US$ 300 bilhões do dia para a noite” 

Inicialmente, precisamos compreender a somatória de efeitos sociais e econômicos da China que criaram, para alguns de forma inevitável, uma bolha no mercado imobiliário do país, que hoje representa um quarto do Produto Interno Bruto (PIB). 

Você não precisa saber muita coisa da China para entender os efeitos causados pelo longo processo de êxodo rural que marcou as últimas décadas. A grande população de 1,3 bilhão de pessoas pouco a pouco transforma a cara do dragão asiático para uma imagem mais urbana e de grandes centros, ao contrário do que era antes. 

Além do fortíssimo êxodo rural, outro fator a se observar é o crescimento da classe média, que consome muito mais que antigamente e eleva o preço médio dos produtos. Inevitavelmente, a soma desses movimentos provoca uma alta substancial no custo de um simples apartamento em uma grande cidade, pois a demanda é muito alta. 

De acordo com dados do Numbeo, das dez cidades mais caras do mundo para se viver, considerando o preço médio de imóveis pelo rendimento médio da população, três são da China. Em Shenzen, cidade que faz fronteira com Hong Kong, o preço médio de um imóvel equivale a 43,15 salários anuais médios de uma família chinesa. 

Por isso, é bem comum que milhares de famílias vivam em cidades vizinhas de grandes metrópoles e se desloquem para o centro para trabalhar diariamente. É um desafio social constante da população, portanto, conseguir comprar um imóvel na cidade onde trabalha, onde quer criar seus filhos e prosperar. 

“Esse movimento da classe trabalhadora, que passa a ter um imóvel em grandes centros, em polos de crescimento, sem dúvida contribui para uma materialização do inconsciente coletivo de toda a população”, aponta Marcelo Hannud. 

Neste cenário favorável, grandes incorporadoras, como a Evergrande, triunfaram. Adicionalmente, a oferta de crédito oferecida pelo governo e por bancos possibilitou que essas companhias executassem megalomaníacos planos de infraestrutura, gerando mais dinheiro e, inevitavelmente, pegando mais dinheiro emprestado também. 

Pandemia em Wuhan, China. Foto: Reuters

Saiba mais

Risco de calote de US$ 300 bi da Evergrande despenca o mercado chinês


O “freio” 

Imagine que uma grande companhia do ramo imobiliário, como a Evergrande, promova uma série de empréstimos milionários em bancos para executar centenas de milhares de projetos de construção na China. 

Esse processo é amplamente comum no mercado e costuma ser vantajoso para a empresa e para os bancos que fornecem o crédito. Isso porque a companhia consegue o recurso que precisa para executar seus planos, enquanto os bancos lucram mesmo com os juros apontando para uma tendência de queda. 

Qualquer sinal de desaquecimento desse processo, porém, especialmente considerando o inflado mercado imobiliário da China, pode significar o surgimento de uma bolha. 

No caso da Evergrande, especificamente, diversos fatores culminaram em um acúmulo de dívidas que a companhia possivelmente não conseguirá honrar. Um deles é o aumento dos juros em todo o mundo, que desaquece a economia, diminui o consumo e começa a causar efeitos negativos no Produto Interno Bruto (PIB) do país. 

Outro grande fator que piorou ainda mais a situação foi a pandemia do novo Coronavírus. Todas as projeções de vendas de imóveis da Evergrande, por exemplo, se viram paralisadas com a queda brusca da demanda e uma população bem mais cautelosa. 

“É inegável que quando acontece essa pandemia, com a redução na renda no país, ou o medo dela, você tem uma retração na demanda”, diz Hannud. “Ela não consegue ter um fluxo de vendas que financia parte da exposição de capital, por isso, não consegue começar a pagar os empréstimos que ela fez”. 

Por isso, aqueles empréstimos milionários efetuados pela companhia para a execução de planos de infraestrutura começam a vencer ao mesmo ritmo que a demanda cai bruscamente. Nesse cenário, a Evergrande, que quer pagar suas dívidas, é como uma bicicleta tentando alcançar um rápido trem-bala. 

Agora, a gigante chinesa tem US$ 300 bilhões para pagar, sem a menor confiança que irá honrar com essas dívidas. 

O que o futuro guarda para a China? 

Por conta das multitudes de fatores que as vezes são específicos da China, existe uma grande apreensão do mercado quanto a um possível efeito cascata nas outras grandes companhias imobiliárias do país. Devido ao baixo nível de transparência do governo de Shangai, é difícil dizer se existem outras incorporadoras que se encontram na mesma situação. 

“Podem existir companhias maiores com um nível de endividamento menor, ou, também tão importante quanto, em um ciclo diferente”, disse Hannud. Segundo ele, a Evergrande foi pega pela pandemia durante o “ciclo de produção”, justamente no momento em que a companhia já havia buscado recursos milionários em bancos para conseguir financiar seus projetos. Agora, ela se encontra em uma situação em que honrar esses contratos começa a ficar inviável.

É difícil prever o futuro, principalmente se tratando da China. O governo de Shangai pode optar por uma quebra gradual da incorporadora, assim como um plano de resgate completo, ou até mesmo uma estatização. 

Segundo o Wall Street Journal, porém, autoridades do país já estão avisando províncias e governos locais para que se preparem para um colapso da Evergrande. Isso pode indicar que o governo não está disposto a resgatar a incorporadora, ao contrário do que muitos acreditavam. 

Enquanto o mercado financeiro teoriza sobre possíveis desfechos, os pagamentos de dívidas da Evergrande já começam a vencer. Nesta semana, ela não honrou com um pagamento de um cupom de US$ 83,5 milhões, derrubando as bolsas mundiais mais uma vez. 

De qualquer forma, a nova crise deve afetar negativamente o crescimento do PIB, já que o mercado imobiliário representa um quarto do crescimento do país. 

O fantasma do subprime 

Com a queda das bolsas globais, um colapso de uma gigante incorporadora e um mercado financeiro preocupado, a comparação da Evergrande com a crise dos subprime dos Estados Unidos vem quase que naturalmente. 

A chamada bolha imobiliária norte-americana, porém, foi ocasionada por fatores bem diferentes do acúmulo de dívidas da incorporadora chinesa. Na época, os chamados empréstimos hipotecários “podres”, de moradores que não honravam com seus pagamentos, eram concedidos de forma irresponsável. 

“Nada parecido com o subprime. Lá, foi o repasse, trepasse, alavancagens de títulos podres. Bancos vendiam créditos insolventes duas e três vezes”, disse Hannud. “Subprime foi uma sacanagem deliberada e orquestrada pelo sistema financeiro habitacional americano. Tem nome, sobrenome e dono”. 

Para ele, a origem da nova crise na China se deu pela diminuição da demanda e quebra de ciclo, ao oposto da fraude do sistema imobiliário dos Estados Unidos. 

Os possíveis efeitos no Brasil e no Mundo 

Quando falamos do mercado imobiliário, a primeira coisa que vem na cabeça são as commodities, principal produto que viabiliza grandes planos de infraestrutura. A quebra de uma grande incorporadora da China, portanto, muito provavelmente trará efeitos ao mercado global de matérias-primas, que tende a esfriar com o impacto na demanda. 

Para Hannud, porém, esses efeitos já estavam sendo observados antes o mercado ficar sabendo da grande dívida da Evergrande. 

“A redução do consumo de commodities vai acontecer independente da quebra da Evergrande”, disse ele. “Será um agravante se acontecer, mas a redução de consumo de aço na China, por exemplo, já acontece. O preço já vem caindo”. 

No Brasil, o esfriamento do mercado de commodities significa menos Dólar entrando no país, já que somos conhecidos por ser uma nação exportadora. Um efeito direto que isso pode trazer é, além do aumento de valor da moeda-norte americana, mais pressões à inflação, que já se encontra alta. Para o especialista, essas coisas já iriam acontecer em um certo grau mesmo desconsiderando a quebra da Evergrande. 

Para ele, porém, também existe o outro lado da moeda: 

“Com a queda dos preços das commodities, também teremos queda do custo destes produtos no Brasil. O ferro aqui subiu estratosfericamente, mais do que deveria porque os efeitos foram especulativos”, disse ele. “Podemos, portanto, usufruir de uma redução por aqui”. 

Outro efeito esperado é que com o desaquecimento da economia da China, além do esfriamento do mercado imobiliário, outros setores pressionados, como o do fornecimento de semicondutores, sejam beneficiados. 

“A China terá que buscar outras formas de incremento do PIB, estimulando outros segmentos”, disse Hannud. 

Foto: Reuters / Reprodução

Juan Tasso - Smart Money

Jornalista Smart Money — Leia, estude, se informe! Apenas novas atitudes geram novos resultados!

1857 posts

Sobre o autor
Jornalista Smart Money — Leia, estude, se informe! Apenas novas atitudes geram novos resultados!
Conteúdos
Postagens relacionadas
ArtigosCuriosidadesDescomplicaEducação Financeira

4 erros de investir na previdência em dezembro

2 Minutos de leitura
Maravilha, tudo bem? Possivelmente você já saiba que a previdência privada do tipo PGBL é o único investimento que oferece um benefício…
ArtigosEducação Financeira

Recupere seu Dinheiro Agora! A Vantagem do PGBL que Você Não Pode Ignorar!

2 Minutos de leitura
Maravilha, tudo bem? Não sei se você já deu conta, mas o final do ano está logo ali. E antes da chegado…
ArtigosEducação Financeira

Investir no PGBL em 2023: Reduza Seu Imposto de Renda até o Final do Ano

1 Minutos de leitura
Com o ano de 2023 em pleno andamento, é hora de considerar estratégias inteligentes para pagar menos imposto de renda e, ao…