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Metas de Inflação, Cenários e Riscos no Brasil

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O regime de metas de inflação foi adotado pelo Brasil a partir de 1999, seguindo a bem-sucedida experiência em países desenvolvidos na década de 1990 como a Nova Zelândia, Canadá e o Reino Unido. Além do consenso em torno da importância da institucionalização de um patamar de referência para a estabilização dos preços, sua criação e manutenção busca dar maior transparência para a condução da política monetária e trazer maior previsibilidade para a economia e seus agentes. 

Nesse regime, são definidos limites de tolerância em torno de uma meta, ou bandas, dentro das quais a inflação anual pode variar para cima ou para baixo. O objetivo não é acertar com absoluta precisão, mas sim evitar que a inflação saia do controle permitindo também a acomodação de choques na economia como secas, crises em outros países, tensões geopolíticas e eventos específicos os quais afetam os preços, mas a política monetária tem pouca ou nenhuma influência. Evita-se assim um ativismo excessivo da autoridade monetária e impactos indesejados sobre a economia e o mercado financeiro como um todo.

A inflação saiu desse intervalo de tolerância em seis dos 23 anos em vigor: 2001, 2002, 2003, 2015, 2017 e 2021. Com exceção de 2017, após a grave recessão econômica de 2015/16, em todos os outros anos o limite ultrapassado foi o superior. Quando isso acontece, de acordo com o Decreto 3.088, de 21 de junho de 1999, o Presidente do Banco Central do Brasil deve divulgar em uma carta aberta as razões detalhadas do seu descumprimento, as providências a serem tomadas para assegurar o retorno da inflação à meta e o prazo esperado. Em 2021, a taxa de inflação, medida pela variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (IPCA) atingiu o patamar de 10,06%, a maior taxa desde 2015, quando foi de 10,67%. 

Os principais fatores que levaram a inflação em 2021 ficar acima de seu limite de tolerância (meta de 3,75%, intervalo de 1,5% para cima ou para baixo) já são bastante conhecidos. Em resumo, conforme o documento, são: i. forte elevação dos preços de bens transacionáveis em moeda local, em especial os preços de commodities; ii. bandeira de energia elétrica de escassez hídrica; e iii. desequilíbrios entre demanda e oferta de insumos, e gargalos nas cadeias produtivas globais. A carta também menciona que a aceleração significativa da inflação em 2021 para níveis superiores às metas foi um fenômeno global, atingindo a maioria dos países, sejam avançados ou emergentes.

Como resposta a esse cenário, o Banco Central já explicitou que seguirá o ciclo de aumento da taxa básica de juros, e continuará a fazê-lo com vistas ao cumprimento das metas para a inflação. Em 2021, ela saiu de 2%, seu menor patamar da história, até chegar a 9,25% no final do ano. Em 2022, a autoridade monetária já comunicou mais um aumento de 1,5% em fevereiro e o mercado já espera que ela atinja o patamar de 11,75% até o final deste ano, conforme os últimos relatórios FOCUS divulgados toda segunda-feira (último em 31/01). 

Ainda segundo o Banco Central, a taxa Selic, que é o principal instrumento de política monetária à disposição, afeta o comportamento das variáveis econômicas e é transmitida para a economia afetando os preços por meio: i. da decisão entre consumo e investimento das famílias e empresas; ii. da taxa de câmbio; iii. do preço dos ativos; iv. do crédito; e v. das expectativas. O movimento atual de aumento da taxa Selic significa, assim, a passagem da política monetária do campo expansionista (outrora de baixa, utilizada como resposta à crise provocada pela COVID-19) para o território contracionista (nesse momento de alta, para controlar a inflação). 

Usando os termos da carta, o Copom, que é o Comitê de Política Monetária, julga apropriado que o ciclo de aperto monetário avance significativamente em território contracionista para reduzir a inflação, supondo uma taxa de juros real neutra de 3,5% a.a. A taxa real é equivalente à taxa nominal descontada a inflação, e o termo neutro se refere a um nível que não tem efeito nem contracionista ou expansionista sobre a economia.

Como as taxas de juros e a inflação tendem a movimentar em direções opostas, é nesse sentido que os últimos relatórios FOCUS estimam que a taxa de inflação deva se reduzir a um patamar próximo aos 5,4% em 2022, ainda acima do intervalo de tolerância, mas convergindo para o centro da meta em 2023. Nesse sentido, o Banco Central passaria a estabilizar e normalizar a taxa de juros, voltando a um nível considerado neutro. Contudo, os riscos de uma inflação mais persistente não são desprezíveis, o que demandaria a manutenção da taxa Selic em patamares contracionistas por mais tempo. Eles envolvem impactos da variante Ômicron, risco no câmbio, por motivos eleitorais, choques como geadas, chuvas, crise hídrica e ainda a trajetória fiscal brasileira, com preocupações acerca da flexibilização do teto de gastos e a condução das contas públicas brasileiras.

Logo, conforme a XP Investimentos, as taxas das NTNBs, ou seja, os títulos públicos que remuneram o investidor a variação do IPCA mais uma taxa de juros fixa, e que, portanto, sinalizam o juro real precificado pelo mercado, se mantêm próximos ou acima de 5% tanto em vencimentos mais curtos como os mais longos, o que reflete uma incerteza elevada à frente. No fim de 2019, esse mesmo juro real chegou a ser negociado abaixo de 3,5% a.a.

Para o investidor, esse cenário pode significar uma oportunidade interessante de alocação tanto em títulos públicos, emissões bancárias e papéis de crédito privado, esses isentos de Imposto de Renda para pessoa física, tanto no sentido de proteção dos riscos inflacionários como de aproveitar um cenário onde as taxas de juros reais estão mais elevadas. Esse tipo de investimento pode trazer ágio para os ativos alocados em momentos de queda do juro real.

Entretanto, é essencial levar em consideração o perfil do investidor, bem como seus objetivos de curto, médio e longo prazo. Importa nessa hora entender em profundidade os riscos e possibilidades de cada alternativa, adequados ao horizonte de tempo, equilíbrio e diversificação de uma carteira de investimentos.

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