Um consenso que parece estar se formando no mercado financeiro é de que as boas projeções quanto à economia brasileira, impulsionadas pelo crescimento do PIB e retomada da normalidade, e o cenário de oportunidades, parece estar esfriando diante um cenário de riscos que devem marcar o segundo semestre deste ano e 2022.
Segundo Fernando Ferreira, estrategista-chefe e head do Research da XP, o sentimento dos investidores quanto à economia brasileira se deteriorou muito nas últimas semanas.
“Esse mau humor fica evidente quando olhamos a performance de preços dos ativos brasileiros recentemente”, diz ele em um relatório.
Com a queda de 7% do Ibovespa desde junho para cá, Dólar voltando a oscilar acima de R$ 5,00 e fluxo de investidores estrangeiros na bolsa ficando com um saldo negativo em junho (-R$8,3 bilhões), as boas projeções para o país começam a apresentar sinal de fraqueza.
Diversos fatores, externos e internos, são responsáveis pelo recente pessimismo dos investidores. Abaixo, confira alguns deles:
Mercado de commodities deve esfriar
Com a retomada econômica nas duas gigantes economias mundiais, Estados Unidos e China, os governos aplicaram planos de investimentos massivos na infraestrutura e retomada geral do país.
Os efeitos são sentidos diretamente no mercado de commodities. Os preços das matérias-primas subiram consideravelmente, com vários economistas chamando o primeiro semestre de 2021 como um período marcado pelo superciclo das commodities.
De forma direta, isso atinge positivamente a economia brasileira. Isso porque o Brasil, assim como outros países em desenvolvimento, é exportador. Com a alta dos preços, os lucros sob os produtos que exportamos aumentam.
Além disso, o Dólar passa por um período de altíssima liquidez, diminuindo seu preço ante as outras moedas. Por aqui, a moeda norte-americana chegou a ficar abaixo de R$ 5,00.
O problema é que todo esse cenário é temporário. Os altíssimos investimentos nas grandes economias têm um custo: a inflação.
Nos Estados Unidos, o Índice de Preços ao Consumidor (IPC) subiu 0,9% em junho, superando as expectativas de alta de 0,5%. Segundo a Federal Reserve (Fed) do país, a alta nos preços foi esperada e não deve ditar regra para os próximos meses.
Mesmo assim, economistas já projetam que a taxa de juros do país, que está sendo mantida a 0% a 0,2%, pode subir mais cedo que o esperado. Neste caso, os efeitos serão de freio no crescimento econômico, podendo normalizar o preço das commodities e deixar de beneficiar países como o Brasil.
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No cenário interno, as eleições de 2022 preocupam
Enquanto o mercado global deve passar por um verdadeiro “breque” no crescimento em 2022, o Brasil estará passando pelas eleições presidenciais, que por si só geram uma gama de problemas.
Embora exista uma instabilidade natural trazida por um processo democrático disputado e acirrado, o mercado financeiro se preocupa com as investidas do governo Bolsonaro para se manter no poder.
O governo, por exemplo, enviará uma PEC ao Congresso Nacional que parcela os precatórios em 9 anos para dar espaço ao Auxílio Brasil, programa assistencial que deve substituir o Bolsa Família. Como os custos com o programa foram elevados, com a alta nos valores pagos e famílias contempladas, o governo está tentando de tudo para achar espaço no Orçamento.
Existe também um risco de membros governistas no Congresso articularem para colocar o pagamento de precatórios fora do teto de gastos.
As manobras fiscais não representam em si uma ilegalidade, mas deixam a imagem do Brasil piorada. Segundo Fernando Ferreira, “os investidores se preocupam em uma possível guinada populista daqui até as eleições”.
A inflação também é um problema no Brasil. Embora a alta dos preços aconteça no mundo inteiro, por aqui os motivos são um pouco diferentes. Para começar, a alta nos preços no primeiro semestre do ano foi impulsionada pela alta severa nos preços dos combustíveis nas refinarias e na conta de luz do brasileiro.
A crise hídrica que afeta o sudeste e centro-oeste brasileiro foi um fator surpresa para o governo, que agora estuda meios para suprir a demanda e diminuir o risco de apagões e racionamento no país. Uma dessas medidas é o ativamento de usinas termelétricas, que são mais caras que as tradicionais hidrelétricas, principal matriz energética do país.
“Um outro ponto mencionado por vários investidores é o brutal aumento da desigualdade no Brasil. Enquanto grandes empresas conseguiram crescer durante a crise, a população de baixa renda foi a que mais sofreu com os efeitos da pandemia”, diz Fernando Ferreira.
O cenário daqui para frente é, portanto, tomado por riscos que ofuscam as projeções de poucos meses atrás de um crescimento sólido do Produto Interno Bruto (PIB) e recuperação geral da pandemia.
Foto: Agência Brasil / Destaques